Exposição na internet deixa usuários vulneráveis a golpes
Um homem capaz de adivinhar o nome dos seus amigos, parentes. De saber onde você passou as férias. Um vidente que revela seus segredos mais íntimos. Verdade ou farsa? Nesta reportagem você vai descobrir detalhes da sua vida é bem mais fácil do que você imagina. Que poder tem Gabriel, o vidente que desvenda todos os segredos? Comunicação com espíritos? Leitura da mente? Paranormalidade?
Ele desvenda todos os segredos. A tenda do vidente foi montada em um shopping no Rio de Janeiro. Convidamos freqüentadores para testar os poderes dele. As pessoas entram um pouco desconfiadas, descrentes.
Gabriel se concentra, diz que vai estabelecer uma conexão energética e começa a revelar segredos, nomes de pessoas queridas, datas importantes. Ele consegue saber onde a pessoa mora e até o número do telefone. O vidente revela os lugares por onde a pessoa andou recentemente e mesmo detalhes muito pessoais, como o apelido do marido. Ele sabe até o que mexe com cada um, o que toca fundo.
Como ele sabe de tudo isso? Qual o segredo desse poder impressionante?
Tudo que parecia segredo estava bem ao alcance de qualquer um, fácil de achar na rede mundial de computadores. A revelação surpreende.
O vidente brasileiro foi inspirado em um vídeo que já tem mais de três milhões de acessos na internet e mostra como é fácil roubar dados pessoais. É uma campanha da federação do setor financeiro da Bélgica.
É um truque fácil de ser feito. Bastou pegar o nome da pessoa na entrada. Assim que ela entrou na tenda, a equipe do especialista em crimes da internet Wanderson Castillho começou a procurar os dados em redes sociais ou mecanismos de busca. Usando um rádio, Wanderson passava as informações para o falso vidente, na verdade, um ator, que caprichou no papel. E muita gente acreditou que ele tinha poderes sobrenaturais. Até informações que a pessoa considerava confidenciais estavam disponíveis na rede.
O vidente não tem poder sobrenatural nenhum. O teste foi para mostrar como é possível saber tudo sobre a vida de uma pessoa usando apenas a internet. Foi uma simulação, mas há inúmeras quadrilhas procurando vítimas no mundo virtual, usando informações dadas voluntariamente por milhões de pessoas e causando prejuízos milionários.
Um estudo de uma empresa de segurança de internet mostrou que, somente em 2011, os crimes virtuais causaram um prejuízo de R$ 16 bilhões no Brasil e atingiram 28 milhões de pessoas, como Eloy Tuffi, empresário bem sucedido do ramo de informática. Ele é namorado da miss Campinas, de 21 anos. Talvez por inveja ou interesses financeiros, alguém criou um blog especializado em falar mal dele, inventar notícias falsas. Segundo o blog, Tuffi faliu várias empresas.
O blog já criou constrangimentos e prejuízos. “Muitos futuros franqueados não fecharam contrato comigo justamente por causa dessas coisas que aparecem nas redes sociais”, conta ele.
Eloy e outros empresários de São Paulo, com o mesmo problema, entraram na Justiça, mas não conseguem tirar as páginas do ar. O material com difamações está em um servidor nos Estados Unidos, que não tem obrigação legal de cumprir ordens da justiça brasileira. A polícia de São Paulo já sabe quem estava alimentando o blog.
Os policiais descobriram que os sites e blogs com difamações eram atualizados em um computador em uma pequena lan house no bairro do Ipiranga, em São Paulo. Para apanhar o responsável foi preciso paciência. Durante dez dias, eles ficaram de olho na loja e na internet. Até que o suspeito voltou ao local do crime. Ele digitou um texto no computador. Na hora em que tentou publicá-lo na internet, os policiais que estavam no local, receberam um alerta e o prenderam em flagrante.
A polícia agora investiga quem contratou os serviços dele. Segundo investigadores, um blog com difamações pode custar até R$ 60 mil.
“Difamação profissional. Existem pessoas hoje contratadas, inclusive por empresas, visando denegrir a imagem de concorrentes e não só de empresas, mas pessoas que querem se vingar. Pessoas que usam a própria internet e as suas ferramentas para pesquisar tudo aquilo que elas podem, todo tipo de informação da pessoa que eles querem difamar”, explica Renato Opice Blum.
No mundo real, pouca gente teria coragem de enfrentar Ricardo Arona. Mas, protegidos pelo anonimato, criminosos da internet estão infernizando a vida do lutador. No mundo virtual, ele é mais uma vítima tentando se defender.
Se no octógono, Arona se vira sozinho, na internet, pediu ajuda à polícia. É só entrar nas redes sociais e digitar Ricardo Arona. Aparece uma enorme lista, quase duzentos perfis. Nenhum feito por ele. Alguém se passa por Ricardo, marca apresentações e até fecha contratos.
“Tive problemas com marcação de trabalhos, palestras que são tanto no Brasil como no exterior. Ele também se comunica e também marca trabalhos para mim no exterior, nos Estados Unidos, na Europa também”, conta o lutador.
Eloy e Ricardo são pessoas públicas, o que facilita o trabalho das quadrilhas, mas há milhões de pessoas expondo a sua vida privada para quem quiser ver.
Segundo a pesquisadora Paula Chimenti, a internet potencializa duas necessidades básicas do ser humano. “Você coloca um comentário, alguém já diz que isso é legal. Você já fica feliz com aquilo. A gente precisa pertencer a um grupo para se sentir seguro, para se sentir feliz. E a gente precisa, dentro desse grupo, ser reconhecido como alguém legal, importante, diferente, interessante”, avalia.
E as informações divulgadas pelos próprios usuários ficam ao alcance dos mais temidos criminosos da internet, os hackers, capazes de roubar todas as informações de um computador.
Em Brasília, a polícia prendeu, no mês passado, Douglas de Lima Santos, de 21 anos. Ele gastou mais de R$ 11 mil em um quarto de luxo e festas em um hotel. O cartão de crédito era falso, obtido com dados roubados da internet. A quadrilha dele desviou uma pequena fortuna.
“Em torno de R$ 40 milhões. E foram gastos com festas, com viagens, com presentes, com frete de aviões”, diz Marco Antônio de Almeida.
Vamos voltar à tenda do vidente. Quando Leonardo entrou na tenda, a equipe do Fantástico não poderia imaginar que ele teria a reação que teve. Foi só o ator que se passa por vidente revelar o nome da namorada para ele acreditar totalmente que estava diante de alguém com poder para normal.
Os especialistas em internet descobriram que Leonardo gosta de cães e ele acabou revelando um sonho: abrir uma empresa para cuidar de animais. Quando a verdade foi revelada, foi um choque.
O advogado Renato Opice Blum, especialista em crimes na internet, diz que as pessoas devem tomar cuidado para não se expor demais: “Tudo aquilo que puder causar um prejuízo para ela no futuro - uma fotografia numa situação mais sensível, um vídeo, um texto mais agressivo, algo que possa revelar um segredo - isso não deve ser divulgado”.
Fonte: GLOBO.com
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